sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O navio fantasma


Começo esse texto e me sinto um pouco perdida tanto tempo faz que não escrevo. No entanto me parece que não há mais nada que eu possa fazer.


De uma forma bastante misteriosa, hoje, enquanto arrumava e limpava meu quarto, retirei Nietzsche da estante. Um livro que ainda não li, como muitos que comprei e coloquei em fila. Compro livros muito mais rápido do que os leio. No primeiro capítulo deste livro, Nietzsche questiona a Verdade humana e a busca pela verdade. Por que buscamos a verdade? Sei que uns, mesmo confrontados com a verdade buscam a inverdade ou constroem a partir da primeira algo que a justifique ou impossibilite. Quando a verdade lhes é inconveniente, é claro.

Me parece que a Verdade não existe. Como pessoas, podemos somente produzir nossas impressões de supostas verdades. No entanto não posso negar a existência de fatos. Fato é que acordei cedo mas fiquei na cama hoje até 11 horas da manhã. Fato é que nasci no Rio de Janeiro em 1989.

O questionamento de Nietzesche não é novo para mim, mas se encaixou perfeitamente em meu dia e por isso chamo nosso encontro de misterioso, e até de poético. "quem com ela sonha é um tolo" diz ele sobre o nascimento da vontade da verdade. Então por que perguntamos? Qual é o impulso que move alguém a tirar os pontos, abrir a ferida e ver o que há por baixo da pele cicatrizada de um corte antigo?

O que leva mergulhadores à Naufrágios? Recentemente, presenciei uma exumação. Logicamente, foi uma exumação metafórica... Mas é incrível como alguns fatos que aconteceram há muito podem mudar toda a sua perspectiva e algumas opiniões quase cristalizadas. é como desenterrar um morto e somente durante a exumação descobrir que tinha dentes falsos. Segredos que o morto levara para o túmulo mas que havia compartilhado com o coveiro ante-mortem. 

A ignorância é, realmente, uma benção? A exumação que presenciei mudou todo o meu momento presente, e talvez isso prove a importância não da verdade, mas da recuperação de fatos para a construção de minha verdade individual. Quando me questiono se eu realmente queria estar presente no evento, se precisava realmente ver o morto, a resposta me parece muito clara. Se eu não visse o morto, viveria uma verdade bonita mas falsa, e a falsidade nela jamais permitiria que me fosse de fato bela. Então retorno aos conceitos do que é verdadeiro e do que é fato. E me questiono também sobre as decisões que tomaria no presente para lidar com o que me sobrara do morto. 

Obviamente, ver cadáveres não é uma experiência nada agradável e não posso recomendar o evento. Mas também jamais recomendaria àqueles que me são próximos a evitarem exumações ou conversas com coveiros. Exumações geram reflexões e mudanças são para aqueles que estão abertos à mudanças, a giros de 180°. Cadáveres podem ser extremamente desagradáveis e até vulgares.

Talvez, da sua experiência mórbida só reste a vergonha de não ter sabido antes.