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sexta-feira, 3 de julho de 2009

Aquela quarta-feira

Junho 17, 2009.
Acordei às 5:00. Às 7:00. Às 7:15. 7:20.
Levantei às oito e meia com um pouco de culpa. Tomei banho e lavei o cabelo com o xampu de tangerina com canela. Sensação de atraso. Enquanto eu esperava para pegar a condução - odeio essa palavra: condução. - minha cabeça ia leve em pensamentos simples dos quais não me lembro.
Uma menina de óculos ia passando, atravessava a rua do outro lado do cruzamento. Ela acenou para mim, deu-me um sorriso gratuito inclinando a cabeça para o lado com uma doçura infantil. Percebi que ela tinha síndrome de Down. Ela me chamou ao dobrar os dedos da mão com a palma virada para cima em sua direção. Eu sorri curiosa. Sorri e fiz que não com a cabeça. Que ficaria onde estava, obrigada. “Eu vou até aí então”. Ela veio até mim e me cumprimentou beijando-me as bochechas, eu não parava de sorrir, ela segurou uma mecha do meu cabelo ainda molhado e cheirou, “que delícia”, ela disse. Ela tinha os cabelos pretos lisos na altura dos ombros e sorria simples. Era linda. Depois ela falou que lutava boxe, e que adorava, a mãe vinha logo atrás dela, comentando, alegre. E foram embora em ritmo de quem tem tempo para gastar. E foi um momento tão singelo e delicado que peguei a Kombi e depois o ônibus pensando em escrevê-lo. Depois esqueci dele.
Cheguei ao trabalho não muito disposta à minha aula de meio-dia. Logo a coordenadora disse que iria assistir a minha aula. Ótimo. O nome dela é Alice. Ela reparou em coisas que ninguém havia reparado antes, nem eu. Falou de como eu tenho controle total do que acontece em sala, e que gostou de como eu lidei com um aluno difícil. Um dos mais difíceis que conheço. O nome dele é César. Ele tem suas manias. Alice notou que eu não sou dependente do livro e foi muito delicada ao apontar até mesmo coisas que eu esqueci de fazer. Fiquei um tempo me perguntando como alguém conseguia ser tão amável e doce.
A Cris apareceu lá no trabalho. Cristiane é uma amiga insubstituível que eu tenho, uma das mulheres que eu mais admiro. A tarde passou rápido e comprei duas blusas na Hering. Eu gosto dessa loja.
A aula de 18:30 foi boa. Um aluno chegou tarde. (40 minutos atrasado) e eu não deixei que ele assinasse presença. Ele reclamou de mim. A Mônica me falou. Ela trabalha na coordenação e ficou feliz por eu ter feito isso. Ela é engraçada, a Mônica.
Cheguei em casa e o computador estava ligado, não pude resistir à tentação da internet. Conversei com o Matteo. O Matt é o Matt e pronto. Não tenho muito a dizer sobre ele. Só sei que ele me derrete o coração com palavras bonitas.
Antes de dormir eu li o começo de Água Viva, de Clarice Lispector. Eu a amo. É incrível o que ela faz com as palavras. Essa admiração é estranha. Queria conhecê-la e dizer a ela que eu adoro o que ela escreve, e que a admiro. Pergunto-me se ela gostaria de saber. Ou de ter sabido em vida. Mas Clarice não precisa que eu ame o que ela escreve. O escrever para ela é uma força da natureza, a inspiração a carrega como uma enchente. Ela está à deriva das palavras que nela explodem. Eu escrevo sem parar e em linha, e muitas vezes eu repito palavras que corto na segunda vez que eu leio um texto. Tem um conto meu que eu adorava. Mas mexi tanto nele que acho que morreu. A palavra morre quando perde a essência, e a essência não consiste na verdade, mas na capacidade de se fazer acreditar. A essência é o talento dramático da palavra atriz.
Esse livro dela é um fluxo de pensamentos, queria poder escrever algo assim sem que digam que a estou copiando. Gostei do que ela disse sobre as violetas.
Hoje foi um dia bom. E agora escrevo linha ininterrupta. Pai, vem ler minha pseudo-crônica.