domingo, 19 de dezembro de 2010

O maior Natal do Brasil

Primeiro gostaria de agradecer à minha amiga Beatriz Cecchetti pela inspiração, confiança e permissão para escrever esse conto. Eu me sinto realmente privilegiada por ter pessoas tão autênticas em minha vida. Obrigada, Bia.

O maior Natal do Brasil
“Com licença, o senhor sabe me dizer o preço desse ventilador?”- Ela perguntou ao homem que estava atrás do balcão.- “Ah, a senhora se incomoda em checar o preço na máquina? Eu preciso terminar isso aqui pra ontem.” - Respondeu ele enquanto cortava códigos de barras. Ela não queria se deixar irritar. Levou a caixa do ventilador até a máquina e fez isso diversas vezes para comparar os preços de diferentes ventiladores. Escolheu o produto que queria e levou-o até um outro balcão onde estava uma mulher com o uniforme da loja. Colocou o ventilador sobre o balcão e olhou para a mulher com expectativa. A mulher a olhou com as sobrancelhas erguidas, empurrou a caixa de papelão com as pontas dos dedos de modo que ela se moveu em direção à cliente e disse: “Eu não sou caixa não.” Seu uniforme tinha um crachá de gerente. Irritada, ela pegou a caixa e procurou forças para se desculpar. A mulher complementou: “Tem caixa ali, ó!” E apontou a direção com o queixo. Ela agradeceu pela ajuda e levou o ventilador ao caixa que era caixa de fato.

Seu ventilador era o último da loja e a caixa estava aberta. O homem pegou um grande rolo de fita adesiva para fechá-la e tentou descolar a ponta da fita adesiva do rolo com as unhas. Foi então que percebeu que ele quase não tinha unhas. Seu dedos tinham as pontas redondas e as unhas eram roídas até o que seria metade do tamanho normal. Ele arrastou a cabeça do dedo indicador no rolo de fita mas não conseguiu descolá-la. Tentou mais duas vezes fazendo força com o dedo mas a fita se recusava a descolar do rolo. Resolveu tentar descolar a fita com o dedo médio, mas sua unha era igualmente curta e débil, inofensiva à fita. Ela respirava lentamente, esperando. Em volta, a loja era nova e havia uma grande pilha de bonecas Barbie do seu lado direito e uma de laptops da Xuxa do lado esquerdo.

Depois de algum tempo, ela não sabia ao certo quanto, o funcionário conseguiu lacrar a caixa e lhe disse o preço. Deu o dinheiro, ao que o funcionário perguntou se poderia ficar lhe devendo dois centavos. Ela respondeu que sim, abaixando e levantando a cabeça lentamente, os olhos estreitos como quem sente um sono irremediável, sobrancelhas erguidas e testa franzida para expressar sua total despreocupação. Ele lhe entregou a nota fiscal e pôs o produto em uma sacola. Ela pegou o saco, colocou-o no chão, deu um passo para trás, olhou as pilhas de brinquedos e abriu os braços em um movimento exato. Caíram caixas e mais caixas cor-de-rosa pelo chão da loja.

O barulho era caótico e ela olhava o homem no caixa com serenidade: sem piscar, o rosto tranquilo. Os funcionários e outros clientes olhavam mas ela havia encontrado algo valioso no caos. Não se incomodou. Silêncio. Os funcionários da loja olhavam para a gerente esperando por alguma reação, qualquer que fosse. Ela olhou a mulher e disse “Obrigada!” com visível irritação. Ao que a outra respondeu: “Que é isso, amor! Obrigada a você, pelo atendimento!”

Quando saiu da loja já não era mais a mesma mulher que era quando entrara, ou talvez tivesse somente mais autoconhecimento.

4 comentários:

a_rosa disse...

ela fez isso mesmo?? nossa! rsrsrs
bom para ela! alívio certo...

Vicentini; Luiza. disse...

Sim, ela de fato fez isso! =)

Madai disse...

É...o natal continua dando o que falar! E o que pensar também. rrsrsrsrs Como fugir disso!?

Anônimo disse...

Esse título seria sugestivo? rsrs

Sua amiga é corajosa! rs

Feliz Natal! :)